Como lidar com um cliente stalker ou abusador em um contrato de desenvolvimento de software?
O prestador de serviços de Tecnologia da Informação, mesmo em início de sua trajetória, ao começar a empreender, deve ter em mãos um contrato que lhe permita uma porta de saída jurídica de “clientes abusadores”, aqueles clientes insaciáveis, "cheios de razão" e por que não dizer, "exploradores" de um contrato mal feito, com base em uma simples proposta ou "e-mail".
Tais clientes exigem de tudo, mudanças no projeto, evoluções, upgrades, tudo afirmando desconhecimento que tais entregáveis estavam fora do escopo, que é pessoa "leiga".
A experiência indica que nos contratos de desenvolvimento, o descritivo técnico é a parte mais importante do contrato, pois delimitará o escopo do projeto a ser desenvolvido, com cláusulas específicas sobre quais “entregáveis” serão desenvolvidos e tão importante quanto, o que “não será desenvolvido”, entregue ou realizado.
É muito importante que o prestador de serviços conheça o projeto a ser desenvolvido nos maiores detalhes possíveis, afinal deverá saber o alcance de suas atribuições no projeto, e as partes do projeto que demandam serviços e custos de terceiros, como a hospedagem, APIs e outras funcionalidades vitais ao funcionamento da aplicação web.
Portanto, a elaboração de um contrato bem-feito visa estipular as regras que vigerão ao longo da execução do contrato, e a adoção de um contrato frágil tornará o prestador de TI uma presa apta a ser abusada pelo cliente mal-intencionado.
Assim, existem muitos cuidados a serem tomados, em especial a elaboração do contrato bem redigido e direcionado à conclusão do projeto, sem permitir muitas alterações no projeto pelo cliente, que “normalmente” alegará desconhecimento das questões técnicas, que o “especialista” é o contratado, não o cliente/contratante.
Todavia, existem situações que o contrato não foi bem elaborado, contém muitas brechas e permitem o abuso do cliente, principalmente com escopos abertos e preços fechados, a demandar redobrada atenção, pois isso poderá tornar o projeto um compromisso eterno e escravizante.
Assim, ao detectar o abuso do cliente, deve-se paralisar o projeto e caso o prestador de serviços entenda a viabilidade de conclusão, chamar o cliente para conversar e definir um aditivo contratual com todos os entregáveis faltantes, de forma a estancar a sangria de solicitações infundadas.
Na verdade, com a detecção de qualquer entregável fora do escopo, o prestador de serviços deverá convocar uma reunião, renegociar o contrato e o escopo do projeto, além de delimitar prazos sempre que possível, e de forma formal, mediante termos aditivos ao contrato.
Se você quiser conhecer um modelo de termo aditivo, clique aqui.
Por outro lado, caso não seja viável tal conversa, o prestador de serviços de TI deverá notificar o cliente, informando que o projeto se exauriu, os valores pactuados se esgotaram com base nos inúmeros desvios do projeto e informar que, por má-fé e abuso do cliente, o prestador de serviços não poderá retomar o projeto, salvo expresso ajuste formal entre as partes, pactuando as condições comerciais.
De fato, existem inúmeros instrumentos jurídicos que socorrem o prestador de serviços exaurido, em especial pelo Princípio do desequilíbrio econômico-financeiro do contrato.
Tal princípio preconiza o desequilíbrio entre a justa remuneração e os encargos obrigacionais do contratado, criado com base no princípio da força maior e caso fortuito, a teoria da imprevisão e o princípio da boa-fé dos contratuais, conforme dispositivos do Art. 187 c/c 422 ambos do Código Civil:
“Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.”
“Art. 422. Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé.”
E por estes fundamentos, com o enquadramento do contratante em uma situação de ilegalidade das normas da boa-fé contratual, em flagrante abuso de direito ou desequilíbrio econômico-financeiro do contrato, o prestador de serviços poderá notificar o contratante de sua conduta, assinalando prazo para a negociação e a assinatura de um termo aditivo, sob pena de inadimplemento contratual.
E evidenciado o inadimplemento contratual, sem o atendimento da notificação, autorizado está o prestador de serviços dar a execução dos serviços como concluída, procedendo com notificação de encerramento dos serviços pactuados.
Se você quiser analisar um modelo de notificação, clique aqui.
Com a correta invocação destes institutos jurídicos, o prestador poderá se resguardar em relação a questionamentos futuros de seus clientes, bem como se desvencilhar de clientes abusadores, mesmo que não possua um contrato razoável firmado, embora em diversas situações, mesmo com a celebração do contrato, o cliente abusador poderá entrar em ação, no entanto com menor recorrência.
Infelizmente, em se tratando de direito brasileiro, o prestador de serviços deverá se socorrer de ajuda jurídica especializada para a invocação destes institutos, diante de sua relativa complexidade.
Caso tenha alguma dúvida sobre estas informações, entre em contato conosco.
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